Essa é minha mãe aos 20 e poucos anos. É assim que
eu decidi que ela será para sempre na minha memória!
Hoje é meu aniversário. Interessante falarmos sobre convivência na velhice justo na semana que marca minha passagem do tempo. Meu filho, nas primeiras horas do dia, me desejou parabéns e de forma carinhosamente divertida me disse: “Quarenta e três anos, hein? Está ficando velhinha”. Entrei na brincadeira e respondi com uma frase que minha adora falar: “Sim! Sou sua velha e cansada mãe!” Demos risadas como só duas pessoas em sintonia são capazes de fazer, sabendo ambos, que a brincadeira tem lá um fundinho de verdade.

Quando eu tinha 16 anos meus pais eram um pouco mais velhos do que eu sou hoje. Fazendo as contas rapidamente acredito que minha mãe deveria ter seus 47 anos e meu pai algo em torno de 52, 53 anos. Não lembro de achar que eles eram velhos naquele momento, mas também não lembro de achar que eles eram como eu me sinto hoje. Trata-se de um sentimento estranho este de ser filha e mãe ao mesmo tempo. Pensar nisso me fez refletir: quando é que percebemos que nossos pais, de fato, envelheceram e como reagimos a isso? A constatação de que meus pais ficaram velhos, para mim (e acredito que para meus irmão também) aconteceu não faz nem 5 anos. Foi quando meu pai teve uma queda bem séria, que gerou uma série de consequências deixando-o bastante debilitado. Já minha mãe é outra história: ela tem uma saúde de ferro, mas sua cabeça está cada vez mais nebulosa. Não vou negar que o primeiro impacto ao estar de frente com o fato de que seus pais agora têm limitações é muito chocante. Gera insegurança, medo, vontade de não ter que lidar com isso. Depois vem a fase da impaciência, da incompreensão de que eles não são mais capazes de fazer uma série de coisas físicas e mentais que até então era comuns para eles. Por fim, no nosso caso pelo menos, entramos na fase de tentarmos ser o mais amorosos possível com eles. Sabemos que nosso tempo com eles nesta vida, está cada dia que passa menor e estar ao lado deles é uma bênção que muita gente gostaria de ter. Mas não é fácil. Existe um eterno mal-estar, um reflexo do que seremos. No caso da minha mãe então, a semelhança física é quase um tapa na cara.

Lembrei de um livro que li tempos atrás e fiquei chocada com a semelhança entre a história da minha família e das personagens da história. O livro chama-se Por favor, Cuide Bem da Mamãe e foi escrito pela sul-coreana Kyung-Sook Shin. A história fala de todo processo de lamento, culpa, remorso e luto dos filhos a partir do sumiço da mãe, que desapareceu ao ir visitar os filhos sempre muito ocupados e que moram em Seul.  Toda narrativa mostra os personagens (todos irmãos) apontando falhas em suas relações com a desaparecida e revelando segredos impensáveis. Este livro me trouxe uma nova forma de lidar com o momento de fragilidade dos meus pais velhinhos. Afinal esta é a última oportunidade que teremos, nesta vida, de limparmos tudo aquilo que não importa e vivermos apenas o nosso amor. As limitações físicas (e mesmo mentais, intelectuais) são bem menos importantes para nos apegarmos a isso.
No início do livro a autora coloca uma frase que é muito tocante para quem vive este processo de acomodar o coração diante da velhice dos nossos parentes. Diz assim: 
Ame, enquanto puder amar – Franz Liszt.
É o que me propus a fazer. As limitações da velhice que tanto me chocaram num primeiro momento, a partir deste ponto de vista, passou a não ter nenhuma importância.