Início de ano traz para a maioria a expectativa de cumprir promessas há tempos agendadas, olhadas e não realizadas. Considero-me com sorte por somar essa natural sensação de início de ano, o fato de ter mudado de cidade e também um pouco do nosso estilo de vida.

Embora estejamos recém instalados, gostaria de compartilhar o aprendizado que tenho obtido com a mudança. Iniciarei com o conforto. Percebo que o conforto quando associado a uma rotina constante pode gerar em nós, seres humanos, uma acomodação não saudável. Conforto pode trazer bem–estar e tranqüilidade e deve ficar claro que considero isso vital para o equilíbrio humano; porém o que percebi pós-mudança, é que como seres humanos, temos tendência à acomodação e à preguiça. E é aqui que mora o perigo. Um ambiente muito confortável, tranqüilo, calmo e rotineiro, pode ser um ambiente propício para a acomodação e o exercício da preguiça.

O conforto vai entrando nas nossas vidas, tal qual o mofo, sem percebermos, tomando conta. No início até notamos, mas depois vamos nos acostumando com o ‘cheiro e as manchinhas brancas nas roupas’. Começamos a achar que é normal, faz parte. Paramos de lutar contra e não só o aceitamos em nossa volta como, muitos de nos o confundimos e justificamos como a tão desejada Qualidade de Vida. Conforto em nossa volta, se não tomarmos cuidado e não lhe dermos o seu devido limite, pode nos tirar coisas preciosas: a nossa autonomia, o nosso poder de superação e realização. A alegria de buscar e encontrar o novo.

Tivemos por mérito, nos últimos anos de nossas vidas uma vida confortável, com pessoas nos ajudando em nossa volta, diminuindo para nós os atritos. Construímos um network de ‘ajudantes’ que com anos de relacionamento, vão lendo até teus pensamentos. Isso somado à vida que o mundo corporativo vai te dando você vai se acostumando às estruturas em volta que resolvem tudo, aos cartazes nos aeroportos com teu nome, aos hotéis de rede onde se bobear você nem lembra em que país está de tão similares que eles são.

Há também o conforto do conhecido. Se você vive na mesma cidade por muito tempo já sabe onde comprar ‘aquele’ pão, quem faz a melhor massa, a quem ligar se algo acontece de errado, qual é o melhor caminho. Emfim, lentamente vamos ficando dependentes, lentos, menos resistentes ao esforço físico e perdemos o instinto de curiosidade, de localização e até o de sobrevivência.

Alguns podem pensar que não tem nada de errado em viver confortavelmente e de fato não deve ter. O errado, sob meu ponto de vista, é não equilibrarmos as coisas. Com diria uma velha professora minha, “busque sempre o caminho do meio”. Mas, como humanos, cedemos a tendência natural da busca pelo conforto e vamos entregando nossa vida aos outros. Quando consideramos que ‘está tudo sob controle’ na verdade são os outros que controlam a nossa vida. Nós é que nos tornamos dependentes deles. Nós é que ficamos dependente do que é conhecido.

Jantamos algumas semanas atrás com um amigo especial que também decidiu dar uma virada na sua vida. Como todo homem proveniente da vida corporativa, criou dependências até há pouco imprescindíveis: ele conta com a ajuda da mesma secretária há 20 ou 25 anos, não lembro bem, mas o fato é que, segundo ele, ela sabe mais da vida dele do que ele próprio. Disse que resolveu ter “a sua vida de volta” porque no posto que ocupa, se deu conta que fazia tempo ela não lhe pertencia mais. Gostei dessa lógica.

Eu mesma percebi que ganhei um gás diferente. Uma vontade, um desejo de descobrir, de conhecer, de começar. E então me toquei, de repente, uma sensação que fazia muito não me acompanhava, algo que estava quase esquecida: a de sentir que tem toda uma (NOVA) vida pela frente.

Pense nisso. E um bom ano Um para você também.

PS. Nosso amigo também disse no jantar que depois de tentar essa nova forma de vida terá duas reações: ou ele sairá mais fortificado ou ele sairá correndo para contratar a mesma secretaria…