Minha família viveu há duas semanas aquelas situações que, mesmo reais, parecem tão distantes que a sensação é de estarmos protegidos delas: no sábado 11 a sobrinha da minha cunhada sofreu um acidente gravíssimo causado pela explosão de gás no seu apartamento em Cascavel, no Paraná.

Amplamente noticiado pela imprensa local e estadual, durante esse final de semana vivemos no ritmo das informações que a família ia nós passando. A cada reportagem, maior consciência do horror; a cada ligação, um misto de esperança e preocupação. Num momento como esse a sensação é que a vida para em torno de você. O único movimento percebido é tua angústia. Maria Luisa está a todo momento conosco desde então.

As investigações estão em andamento e teremos que aguardar para conhecer as causas oficiais do acidente, mas é inevitável refletir o que leva a acontecer um acidente dessa natureza e magnitude nos dias de hoje, com tantos recursos para evitá-lo. As hipóteses são diversas e todas elas me conduzem, nestas semanas de reflexão, a dois pontos que gostaria de compartilhar: a leviandade com que somos capazes de tratar assuntos tão sérios minimizando, mesmo que inconscientemente, as consequências de nossos atos; e a avareza que muitas vezes guiam nossas decisões, que no fim, decidem vidas.

Sabemos pelas depoimentos e manifestações de moradores e vizinhos do prédio onde Maria Luisa morava que as queixas com cheiro de gás existiam havia algum tempo. Houve reclamações com os administradores do prédio que é destinado a estudantes, que vão até Cascavel, na esperança de construir seu futuro. Foi o caso da Maria Luisa. Com 20 anos e tendo tentado a medicina algumas vezes sem sucesso, sua felicidade era imensa em iniciar a faculdade de seus sonhos. Morando pela primeira vez sozinha, longe de casa, é fácil imaginar o estado de abertura para esse mundo novo que se abria em frente dela. Infelizmente mais trágico do que podia imaginar.

O que faz um vazamento de gás não ser evitado? No caso da Maria Luisa acredito que as vistorias devem ter sido feitas. Então, porque uma explosão dessa magnitude que destrói paredes e joga móveis para fora do prédio? Como temos mais perguntas que respostas no caso da Maria Luisa vou recorrer a minhas experiências, inclusive algumas recentes, para refletir sobre a nossa prontidão à leviandade e avareza.  Estamos com problemas de cheiro de gás  no condomínio que moro. Há alguns anos passamos pela mesma situação. Uma vizinha e eu sentimos o cheiro. Num primeiro momento, foi o olfato que desmentia nosso alerta. Quando insistimos por uma vistoria, não lembro ao certo, mas levaram dias para isso acontecer. Foram realizadas as medições para avaliar a existência de vazamento. Nada encontraram. O cheiro continuava – na época bem mais forte do que hoje – mantive minha exigência e a aí começou a se criar um ambiente que faz muitas vezes recuarmos daquilo que é certo: em algum momento, você que reclama, se torna um incômodo, o que está errado. Para quem reclama parece que o foco passa a ser minimizar tuas avaliações e percepções. As palavras de funcionários sem a qualificação nem os instrumentos necessários se tornam quase verdades. Precisa ter firmeza para atravessar esse período e não relaxar. Afinal, todos deveriam lembrar que está se falando de gás que pode levar à morte. Por isso classifico desta fase de leviandade. Ninguém tem a intenção de que um acidente aconteça mas se minimizam os riscos e os motivos são diversos: a vida corrida, o desgaste de tratar com fornecedores que nem sempre são tão qualificados como deveriam ser… seja qual for a razão, tendemos a deixar ao destino, o que está nas nossas mãos. É muito parecido ao que a maioria de nós, infelizmente costuma fazer: beber e dirigir. As nossas convicções são fortes: bebi pouco, estou acostumado… A maioria não sofre nenhum acidente e isso vai nos qualificando para continuar arriscando. Leviandade. Após um acidente, mais ainda se for fatal, passaremos a vida arrependidos. E outra família, a vida sem o ser querido por perto.

Voltando à história do gás que vivi alguns anos atrás, concordo que havia um laudo que dizia que não havia vazamentos mas é necessário investigar se a queixa continua. Na insistência, nova vistoria. Encontraram o vazamento. Feita a obra, o cheiro continuava. É residual diziam. Vamos acreditar, afinal os técnicos são eles. O cheiro persistia, minha insistência recomeçou. Encontraram um segundo ponto de vazamento. Problema resolvido. E se não tivesse insistido e fincado sem arredar o pé?

Sobre a avareza – que creio não se aplica ao caso acima – penso nas vezes que a decisão de refazer um serviços, de reparar problemas sérios – especialmente para quem presta serviços – é guiada pelo dinheiro que isso representará. Quantas vezes minimizamos para nós mesmos os efeitos nocivos do erro para evitar gastar dinheiro e esforço. Novamente, ninguém pensa propositalmente em ferir alguém, porém, assistimos horrorizados a adulteração de produtos alimentares para ganhar mais dinheiro, mas o quanto, no nosso pequeno mundo, medindo as devidas proporções, não agimos de forma similar, gerando algum tipo de prejuízo ao outro para nos poupar? O que afinal nos guia? Quando leviandade e avareza se juntam a bomba pode ser explosiva. Em se tratando de gás, isso pode ser literal.

No problema atual do meu condomínio o cenário é diferente. Estão agindo rápido, aprendemos com os erros. Que casos como o da Maria Luisa possa nos tocar e nos chamar à responsabilidade. Que o receio de ser chata e inconveniente seja menor que o desejo de evitar uma tragédia. Que a vida seja maior o dinheiro.

Abaixo os links com as notícias do acidente da Maria Luisa. Neste caso peço para que compartilhem este post ou as notícias abaixo listadas. Manter o assunto vivo nas redes sociais ajudará a que as autoridades saibam que estamos todos atentos ao processo de esclarecimento da tragédia em que Maria Luisa e todos nós fomos envolvidos. Devemos isso a Maria Luisa. Gratidão àqueles que nos ajudarem nessa empreitada.

http://g1.globo.com/pr/oeste-sudoeste/noticia/2017/03/jovem-sofre-queimaduras-apos-explosao-em-apartamento-no-pr.html

http://www.tarobacascavel.com.br/secoes/2017/03/jovem-queimada-em-explosao-e-transferida-do-hu/

http://catve.com/noticia/6/177921/medico-da-detalhes-sobre-estado-de-saude-da-jovem-maria-luiza-kamei

http://catve.com/noticia/6/177929/abalada-mae-de-maria-luisa-fala-com-a-imprensa-e-agradece-apoio