Venho refletindo bastante sobre um tema que desejo compartilhar com vocês: minha visão sobre o momento político do país. Quem me acompanha nos textos do blog deve ter reparado que uma das diretrizes que sigo é não falar diretamente sobre política. Tenho dois motivos principais que fundamentam essa decisão: o primeiro se baseia na compreensão de que a política é um sistema bastante complexo que a maioria desconhece, independentemente do grau de instrução. Vira, em muitos casos, uma discussão embasada em suposições sem grandes fundamentos. Como há pessoas realmente entendidas em política que usam essas discussões para esclarecer conceitos e ideias, minha posição é mais de ouvinte e de aprendiz.

O outro motivo pelo qual não falo diretamente política é a agressividade que tem acompanhado a troca de ideias. Devo dizer que, com esses anos todos de pesquisadora, tendo a acreditar que a raiva extravasada nesse tipo de discussões tem origem pessoal e não política. Não conheço, embora seja bem possível que exista, alguém feliz que jorre raiva e veneno pelas redes sociais. Assim, essas pessoas conseguem desabafar a sua infelicidade e gerar energia, por mais bélica que seja, para conseguir se manter em pé perante a vida. Quem não conhece alguém que sempre está buscando o conflito? Que faz crítica a tudo e a todos? Pois costumam ser essas pessoas as presas fáceis das fake news que destilam ódio. Que criam uma realidade inventada para ser sustentada por aqueles que desejam que esta seja verdade.

Por outro lado, meus textos não deixam de abordar a política quando falam de valores pessoais, de ética e moralidade que praticamos ao conviver com a desigualdade social do Brasil, – por exemplo – seja esta econômica, educacional ou de gênero. Quando pretendem elucidar e questionar nossos atos e decisões, especialmente nos nossos relacionamentos pessoais. Todo relacionamento com um grupo social, que integra a “pólis”, é uma forma de política. E prefiro fazer a minha contribuição dessa maneira.

Desta vez, penso que chegamos a um ponto na política governamental que não me deixa, moralmente tranquila, fingir que nada se passa e continuar a falar sobre o nosso microcosmo. É hora, penso, de olhar o macro e entender que colocar o rosto no buraco não irá evitar que as coisas aconteçam. Sou favorável ao pensamento da política Marina Silva. Digo isso de cara, para esclarecer que, mesmo reconhecendo todos os benefícios sociais que o PT fez, especialmente no seu primeiro governo, sabendo do bom nível intelectual e político de vários de seus membros, nunca fui defensora desse partido. Pelo contrário, acredito que de certa forma, parte da atual agressiva polarização da nossa sociedade tenha sido salientada durante esse Governo.

Também creio que a alternância no poder de diferentes visões da realidade e do futuro para o país, por pior que possa ser, é mais proveitosa que a permanência de uma só visão. Essa alternância corrige limitações de visão que todo segmento e linha de pensamento têm. A alternância também nos ajuda a verificar as falhas e acertos de cada posicionamento político, incorporando em nós um conhecimento mais sólido sobre cada linha de pensamento, suas limitações e suas abrangências.

Feita essa apresentação dos meus pontos de vista – e peço desculpas se ficou longa –, quero expressar que a minha avaliação sobre qualquer líder – empresarial, comunitário, familiar, religioso ou governamental – passa pelo filtro da responsabilidade de transmitir valores morais e éticos, inerente ao lugar de privilégio social que a posição de liderança traz consigo. Por conta disso, foi doloroso para mim ver a eleição do atual presidente da República e saber que seu Governo, com sua ideologia, estaria liderando o país por, no mínimo, quatro anos. Doloroso principalmente porque vínhamos de anos difíceis, nos quais o sistema de corrupção foi trazido à luz, o que exigia de nós, eu entendia, uma atitude firme em relação a valores humanos e sociais.

Foi doloroso observar que a escolha da maioria, mais uma vez, tinha sido sustentada pela ideia de que a economia e as finanças resolveriam a maior parte de nossos problemas. Essa ideia foi mais importante, na hora do voto, do que os valores que eram claros e evidenciados pelo então candidato. Porque se tem uma coisa que temos que admitir é que o atual Governo nunca escondeu sua posição em relação à equidade de raça, de gênero e social; tampouco ocultou sua posição em relação à sustentabilidade e proteção da natureza. Se tem algo de positivo, é que, especialmente o atual presidente da República, tem se mostrado coerente ao que sempre foi em todos os seus anos de política. Portanto, quem votou no atual Governo provavelmente compactua com seus valores – o que vou continuar lamentando, mas respeito porque isso faz parte do processo democrático. Por outro lado, se agora não compactua com os valores apresentados e votou a favor, talvez valha a pena refletir e colocar na balança o que é mais importante: a postura e valores morais ou a promessa de uma economia melhor.

Independentemente do voto, creio que todos nós devemos refletir honestamente, de forma pública ou privadamente, sobre nossos valores para além do discurso social que fazemos. O que realmente é importante para cada um de nós? Para a sociedade que estamos gerando e deixando para nossos filhos? Dinheiro? Decência? Educação? Se tiver que fazer escolhas, do que abriria mão?

Nosso voto para eleger políticos representa muito mais nossos valores do que talvez queiramos admitir. Em vez de buscar desculpas e culpar os outros, que tal fazer a nossa parte e olhar para dentro de nós e para os valores que nos guiam? Que tal começar a ler e estudar um pouquinho mais sobre a vida de cada candidato? Creio que todos que me leem já entenderam que não adianta “não gostar de política”. Ela interfere intimamente nas nossas vidas e, em época de pandemia, essa frase tem um real e assustador sentido. Faz parte da nossa maturidade como pessoas e cidadãos adultos assumir nossa parcela de responsabilidade  sobre o que está acontecendo com o Brasil.