Quando a Nany propôs falarmos de estrutura familiares esta semana, pensei comigo: “Que tema bom! Fácil de ilustrar”.  Estava enganada. Falar de família é complexo. Especialmente porque é um dos pilares da sociedade mais envoltos em crenças, valores tradicionais e aparentemente imutáveis. Como já cantou o Titãs:

Família Família
Almoça junto todo dia
Nunca perde esta mania
Mas quando moça quer fugir de casa
Precisa descolar um ganha-pão
Moça de família se não casa
Papai mamãe não dão nenhum tostão
Como sempre é mais difícil lidar com emoções que nos atinge de forma tão visceral, eu relutei muito em usar meus próprios exemplos para expor o assunto. Fiquei pensando em mil outras possibilidades para debatermos o tema, mas aquela vozinha que existe dentro de nós, me disse:  “vai falar das verdades mais difíceis sem se comprometer”? Pois é! Não dá.

Um dos dramas que atinge as pessoas quando se trata de família é a culpa. A mãe que se sente culpada porque tem que ir trabalhar e deixar os filhos com outras pessoas. O pai que não consegue dar atenção. O filho adulto que não consegue lidar com os pais como gostaria. E por aí vai. Entre os tipos de culpa, uma das mais poderosas e devastadora, sem dúvida, é da mãe (ou pai) que não consegue gostar do filho como gostaria (ou como acha que é certo). Ou ainda, que gosta “mais” de um filho do que do outro. Primeiro me parece que é preciso separar amar de gostar, para tentar entender um pouco o que se passa com nossos sentimentos. O amor se estabelece a partir da proteção, da educação, de doar-se a ponto de tirar o que está comendo da própria boca e dar ao filho. Já gostar está totalmente ligado a empatia, a personalidade, a química e, para aqueles que acreditam, a outras vidas.

Aprendi a lidar com isso faz pouco tempo. Meus pais têm 4 filhos legítimos e mais um adotivo (não vou nem entrar nesta questão), mas um fato é incontestável: todos nós fomos amados, protegidos, estudamos, temos valores sólidos, fizemos nossas carreiras, nossa própria família, nenhum grande vício ou problemas estruturais sérios. Todos devemos isso a uma vida de sacrifícios e renúncias dos nossos pais. E todos sabemos também, não importa o quanto expressamos, que cada um de nós temos ligações completamente diferentes com eles. Eu sou a única mulher e minha mãe sempre exigiu muito mais de mim do que dos meus irmãos no que diz respeito a cuidar da casa e até mesmo sobre responsabilidades, mas sempre fui a “mocinha” da casa. Já um dos meus irmãos mais velhos é cópia da minha mãe (até fisicamente) e ambos têm personalidade muito forte e pouco se entendem. Meu irmão mais velho, para minha mãe, sempre será o sacrificado que precisa de cuidados. Já meu irmão mais novo é o iluminado, a bênção da casa, o “espírito evoluído”, como ela gosta de dizer. Ela o admira, mas não o compreende, tenho certeza.

O mais interessante desta história é que a vida é maravilhosa, pois atualmente o único filho que mora perto dos meus pais e é capaz de atendê-los rapidamente em caso de emergência é o meu irmão “turrão”, espelho de minha mãe. É como se a vida deixasse claro para eles: “A gente precisa se entender”.

Tenho uma família maravilhosa – é verdade. Todos nos sentimos abençoados e, como bom italianos que somos, celebramos isso. Adoramos repetir as histórias que vivemos e pegar “um no pé do outro”. Mas nos ofendemos se alguém de fora falar algo que não gostamos sobre qualquer um de nós. 

Minha reflexão maior de tudo isso é que o diálogo é o melhor caminho entre pais e filhos, por mais clichê que isso possa parecer.Uso uma expressão que se encaixa perfeitamente aqui: acende a luz do trem fantasma para descobrir que o esqueleto é de plástico. Onde há amor, há sempre uma possibilidade de entendimento.