Sacrifício! Esta é a palavra que escolhi para explicar a sensação que se tem ao perceber que você está de volta ao seu verdadeiro eu. Pode parecer uma estranha palavra para associar a algo tão pleno. Mas não é. Sacrifício, muitas vezes confundido com renúncia ou abandono, na verdade, tem seu verdadeiro significado no tornar sacro. É disso que estou falando.

Durante toda esta semana temos debatido sobre o caminho que se segue na busca do que verdadeiramente somos. O tão desejado reencontro com nossa essência, nosso ser uno, inteiro, que faz parte de um todo muito além de nós mesmos. Já deve ter ficado claro que não há outro jeito de se fazer isso, a não ser por meio do voltar-se para dentro, seja com que ferramenta for e, ao fazermos isso, inevitavelmente somos conduzidos (quase induzidos) a perceber que tudo aquilo que não faz sentido em nós tem que deixar de existir . Toda dor, toda raiva, toda mágoa precisa ser oferecida para forças que vão além de si, como um chamamento sagrado – o sacrifício. Não significa não mais sofrer, não mais trilhar o caminho humano do crescimento, das provações. O que muda é a forma como lidamos com nossas vidas, sensações, emoções e com o outro. O que não é verdadeiramente essencial  passa a ter um peso menor, nossa integridade nos equilibra, nos deixa num estado de serenidade que passa a ser a força que nos sustenta, que nos dá força para ir além. É como o rio que flui aceitando o caminho, agradecido pela existência.

Jamais vou esquecer a primeira vez que senti esta sensação. Me refiro a ela como paz interior e a qual a Nany chamou de contentamento interno, no seu texto que abriu a semana aqui. Era época da faculdade e eu estava saindo do campus quase vazio. Uma tempestade se formava no céu e uma rajada de vento me fez parar e ouvir o barulho das árvores. Fiquei parada ali, paralisada eu diria, submersa em mim. Não estava em outro lugar, não estava numa experiência transcendental. Nada disso. Estava ali. Totalmente, completamente, inteiramente ali. Até hoje esta lembrança me traz lágrimas aos olhos e sinto o vento batendo no meu rosto. Fazia meses que buscava por isso e, simplesmente, naquele momento, havia finalmente me conectado comigo mesma. Não há palavras que possam expressar exatamente a sensação. É algo muito individual. Uma citação do alquimista Morienus de Roma, eremita cristão do século VII, diz:

O portal da paz é sobremaneira estreito e ninguém poderá atravessá-lo senão pela sua própria alma.
É lindo, é divino e é humano. Por mais estranho que isso possa parecer. E é como o pianista Benjamim Taubkin diz no depoimento abaixo: “Parece que fomos condenados a ser feliz!”