Como é bom namorar, não é mesmo? Quando estamos no início do relacionamento ou ainda na fase da conquista, ficamos nervosos, ansiosos, meio que em estado permanente de atenção a tudo que se relaciona à pessoa que cativou o nosso interesse. Caprichamos em ser o nosso melhor, temos o riso solto e o corpo tenso. Ficamos alguns tons acima de nossa verdadeira melodia, na busca por uma harmonia a dois que nos leve ao sonho do amor perfeito, mesmo que temporário.

Com os anos, a rotina diária nos absorve. A vida com seus inúmeros altos e baixos nos desgasta e aquela parte “melhor de nós” dá lugar a traços comportamentais e atitudinais herdados das nossas famílias, nossas referências mais íntimas e próximas. Nem sempre essas referências são boas, pelo simples motivo de que elas ocorreram em outro tempo, em um mundo bastante diferente do que vivemos hoje, especialmente no que se refere aos relacionamentos amorosos. Mas tendemos a imitá-las ou a negá-las, tendo-as sempre como ponto central da nossa ação amorosa. Não é à toa que grande parte do trabalho de autoconhecimento passa pelo entendimento profundo do pai e da mãe que nos fizeram humanos.

Esse movimento de sair de nós para operar com referências externas, nos nossos relacionamentos amorosos, se deve ao fato de que nossa atenção se deslocou para fora, para a vida que nos chama, que nos impele a lidar com ela rotineiramente, meio no sobressalto. É nesse processo que o namoro se esvazia, se perde nas lembranças de um início. Muitos dizem que o namoro dá lugar ao amor. Discordo: namoro e amor são coisas diferentes que podem até andar juntas, embora seja mais comum que se afastem. Não são fases; o namoro é uma forma de viver o amor.

O relacionamento amoroso felizmente duradouro exige atenção o tempo inteiro. É como respirar. De tão distraídas e aceleradas mentalmente que andam as pessoas quase se esquecem de respirar. Fazem-no minimamente, numa respiração curta que mal atende todas as suas células. Quando voltamos nossa atenção ao respirar – através da meditação, por exemplo –, nos surpreendemos com o quanto deixamos de fazê-lo em toda a sua plenitude porque entramos no modo automático. E, no automático, nosso corpo entra em estado de sobrevivência e escassez: vai usar o mínimo possível de energia para nos manter vivos.

Da mesma forma é no amor: quando treinamos olhar para nosso relacionamento amoroso, podemos notar o quanto o negligenciamos no dia a dia. O quanto, por já fazer parte da nossa vida e nos sentirmos seguros dele, deslocamos nosso esforço para o que é externo à relação. Por isso o namoro é fundamental, e – apesar de eu não gostar de datas comemorativas comerciais – ter um dia dedicado a ele nos ajuda a voltar ao eixo. A trazer nossa atenção a esse ponto tão relevante da nossa vida: o amor romântico.

O namoro é um dos braços do relacionamento amoroso. É uma de suas formas. Ele nos adoça, nos envaidece positivamente, nos deslumbra e nos tensiona. Tensão saudável para voltar a olhar os detalhes que fazem que a vida a dois não se perca na vida com muitos, resultado destes tempos de relacionamentos digitais. Quando há namoro, independentemente do tempo que se está junto, o ambiente no qual o relacionamento se movimenta fica mais doce, mais leve e, por isso, mais agradável.

Ao longo dos anos de relacionamento, penso que o namoro apresenta diversas fases. Há a fase da descoberta e do tesão. Há a fase de criação do sonho da vida compartilhada. Há a fase da construção e realização. Há a fase da manutenção e de olhar para os frutos dessa vida a dois. Em todas elas, mesmo que a energia mude, que o diálogo tenha interesses até opostos e que nossa “atenção” com a vida tenha se acomodado, o carinho e a emoção que emanam ao relembrar o início de tudo – olhando, quem sabe, fotos da época – reacendem os sentimentos que sustentam uma parte desse amor escolhido.

O namoro é a parte do amor que se alimenta com gestos. O gesto do presente, o gesto da escrita, o gesto que invade o ambiente com cheiro de flores e notas de um perfume que nos traz de volta. Gestos que nos faze retornar ao eixo, à conexão com o lado lúdico do amor, para, assim como uma respiração profunda, devolver a anima que dá vida.